CARTA DE CONTROLE MULTIVARIADA DE BENFORD PARA AVALIAÇÃO DE SUSPEITAS DE FRAUDE EM LANÇAMENTOS FINANCEIROS

Davenilcio Luiz de Souza1

André Luis Korzenowski2

Nelson Hein3

Adriana Kroenke4

Resumo: O estudo propõe um método de monitoramento de movimentações financeiras por uma Carta de Controle multivariada com base na aplicação da Lei de Benford para detecção de suspeitas de fraude em lançamentos financeiros. O estudo foi conduzido por meio de modelagem e simulação, por técnicas matemáticas e tecnologia computacional para a solução do modelo. Foram gerados dois conjuntos de dados que concordaram entre si, onde a taxa de alarmes foi definida em Número Médio de Amostras coletadas até a detecção de sinais fora de controle (Average Run Length - ARLs) validando o método. Para a utilização das cartas em dados reais foi realizada a padronização dos valores e limites de controle. A suposição básica da proposição é de que dados de movimentações financeiras se comportam de acordo com a distribuição dos primeiros dígitos de Benford. A estatística do teste foi computada comparando o vetor de primeiros dígitos observados com o valor de referência dado pela distribuição de Benford que configura o monitoramento com parâmetros conhecidos caracterizado pela Carta de Controle χ2. A performance da Carta de Controle pode ser avaliada por meio da taxa de alarmes falsos e da capacidade da carta em detectar corretamente desvios à distribuição de Benford. A aplicação do Limite de Controle padronizado obtido por simulação na Carta de Controle multivariada χ2 demonstrou praticidade e facilidade de análise nas estatísticas geradas. O desenvolvimento de um modelo de aplicação da Carta de Controle multivariada traz inovação ao controle estatístico de processos aplicado à área financeira com o uso de recursos computacionais acessíveis e de fácil processamento.

Palavras-chave: Carta de Controle Multivariada; Lei de Benford; Suspeitas de fraude financeira.

BENFORD MULTIVARIED CONTROL CHARTER FOR ASSESSING FRAUD SUSPECTS ON FINANCIAL LAUNCHES

Abstract: The study proposes a method of monitoring financial transactions by a multivariate Control Letter based on the application of the Benford´s Law to detect suspected fraud in financial postings. The study was conducted by means of modeling and simulation, by mathematical techniques and computational technology for the solution of the model. Two sets of data were agreed upon, where the alarm rate was defined as the Average Number of Samples collected until the detection of out-of-control signals (ARLs), validating the method. For the use of the charts in real data, the standardization of values and control limits was performed. The basic assumption of the proposition is that data on financial transactions behave according to the distribution of Benford’s first digits. The test statistic was computed by comparing the observed first digit vector with the reference value given by the Benford distribution that sets up the monitoring with known parameters characterized by the χ^2 Control Chart. The performance of the Control Chart can be evaluated by means of the false alarm rate and the chart’s ability to correctly detect deviations from the Benford distribution. The application of the standardized Control Limit obtained by simulation in the χ^2Multivariate Control Chart demonstrated practicality and ease of analysis in the generated statistics. The development of a multivariate Control Letter application model brings innovation to the statistical control of processes applied to the financial area with the use of accessible and easily processed computational resources.

Palavras-chave: Multivariate Control Chart; Benford’s Law; Suspicions of financial fraud

1. INTRODUÇÃO

O International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB) assevera que a auditoria tem como finalidade incrementar o grau de confiança dos stakeholders nas demonstrações financeiras. O auditor expressa a sua opinião sobre as demonstrações financeiras e como estas foram preparadas, em todos os aspectos materiais, de acordo com a estrutura conceitual de relato financeiro aplicável. (Martins, 2013). Com efeito, já não de hoje este preparo e acompanhamento é mediado pela computação. O processamento e a transferência de grande massa de dados proporcionados pelas tecnologias da informação (TI) e da comunicação (TIC) permitiu fácil trânsito de informações pela internet. Estes recursos viabilizaram o crescimento das relações dos negócios em caráter global, principalmente pelo e-commerce e as transações entre as entidades financeiras. (Cury & Capobianco, 2011).

Os avanços tecnológicos também propiciaram a sofisticação na prática de crimes, a exemplo do avanço da lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo na década de 1980, em razão disso Daniali (2014) destaca a importância da prevenção da lavagem de dinheiro (e-money laundering) por meio eletrônico. Em resposta a crescente preocupação com a ameaça que a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo representa aos países, ao sistema bancário e as instituições financeiras em nível mundial, foi criado o Financial Action Task Force (FATF, 1989), órgão de decisão internacional com a função de gerar a vontade política necessária para promover reformas legislativas e regulamentares nos países membro. (FATF, 1989). Como consequência de sua evolução, a auditoria que originalmente se desenvolveu nas áreas contábil e financeira assumiu novos papéis com intuito de proporcionar robustez aos controles internos das organizações. (Bertoni & Carvalho, 2014). Segundo Martins (2013), os controles internos tornaram-se imprescindíveis nas grandes organizações nas décadas de 1940 e 1950. De acordo com Motta Jr. (2010) a auditoria interna consolidou-se dando origem a auditoria contínua na década de 1990, reforçada pela exigência de transparência corporativa por meios digitais, principalmente a órgãos da administração pública ao cidadão. A robustez das ações de governança corporativa em sistemas de informação tem as melhores práticas nas publicações da biblioteca do Information Technology Infraestruture Library (ITIL) do Reino Unido e de gestão do Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (COSO) referência nos Estados Unidos e especificamente a norma ISO 27001 que trata dos requisitos para certificação de Sistemas de Gestão da Segurança da Informação. Segundo Porter et al. (1980), sistemas de controle e prevenção contra ameaças e invasões foram criados e mantidos para promover práticas robustas de controle em conformidade com os princípios organizacionais, transparência e atendimento a requisitos legais, a exemplo da lei Sarbanes-Oxley (SOX) dos USA aprovada em 2002 com o objetivo de prevenir fraudes financeiras. Dentre os impactos e as consequências da não detecção de eventos que proporcionam a lavagem de dinheiro, Amorim, Cardozo & Vicente (2012) e Yuen (2014) consideram que o dinheiro ilícito causa diversos problemas de cunho social e econômico aos países como a desvalorização da moeda nacional, pressão sobre o câmbio e a impunidade dos criminosos, o que gera descrédito na Justiça.

Apesar da evolução dos sistemas de controle, ainda há limitações, segundo Coelho (2015) as auditorias financeiras são realizadas em dados coletados por amostragem. Desse modo são incapazes de identificar em tempo real uma situação de delito. Isto posto, verifica-se que o tema apresenta oportunidade de desenvolvimento de novas aplicações de recursos estatísticos. (Souza, 2017). Inovações em atividades de investigação no monitoramento estatístico de processos são apresentados por Woodall & Montgomery (2014) salientando que, a gama de aplicações expandiu-se para diversas áreas do conhecimento. Como exemplo desta expansão temos, Duczmal, Kulldorf & Huang (2012), Maro et al. (2014), Boscoe, Talbot & Kuldorff (2016) que desenvolveram aplicações da estatística na área médica pela análise espaço temporal de epidemias, incidência do câncer, vigilância sanitária, controle dos riscos do uso de medicamentos e a divulgação de informações de domínio público com cunho preventivo.

A estatística aliada à distribuição de Benford tem sido aplicada por vários autores na identificação de suspeitas de fraude em dados contábeis e movimentações financeiras. Durtschi, Hillison & Pacini (2004) utilizam na detecção de fraude em dados contábeis; Bhattacharya, Xu & Kumar (2011) aplicam como sistema de apoio a análise e decisão sobre dados de relatórios financeiros; Clippe & Ausloos (2012) usam como recurso estatístico na investigação e análise de dados de contribuições financeiras realizadas para entidades religiosas. Nigrini (2011, 2012) aplica na contabilidade forense em auditorias para a detecção de fraudes, na análise e investigação de suspeitas de lavagem de dinheiro; Silva et al. (2014) na identificação de padrões estatísticos em suspeitas de fraude por lavagem de dinheiro.

A literatura indica que movimentações financeiras sem indício de fraude seguem a Lei de Benford e aponta uma lacuna de aplicação de um recurso de vigilância estatística para o monitoramento e análise de movimentações financeiras como suporte às atividades de auditoria. Os métodos de monitoramento de dados de movimentações financeiras carecem de um modelo computacional gerador de estatísticas que permita o aprendizado pela análise de padrões e de suas mudanças em tempo real. Neste cenário surge a questão que norteia a investigação: qual a aderência da Lei de Benford na movimentação financeira? O estudo tem como objetivo propor um método de monitoramento de movimentações financeiras por uma Carta de Controle multivariada com base na Lei de Benford, utilizando simulação e o aprendizado em movimentações retrospectivas para detecção de suspeitas de fraude, entre elas as devidas à lavagem de dinheiro.

2. AUDITORIA E LAVAGEM DE DINHEIRO

A O contexto mundial contra fraudes e a lavagem de dinheiro provocaram a busca por recursos capazes de identificar, prevenir e combater tais delitos. West & Bhattacharya (2016) relatam que devido as facilidades que as novas tecnologias proporcionaram como a internet e a computação móvel, conduziram a um aumento da fraude financeira no período de 2004 a 2014. Segundo Yeh & Lien (2009) isso se deve principalmente em razão da ampliação do número de cartões de crédito que movimentou o comércio, mas teve como consequência um incremento nas fraudes. Bhattacharya, Xu & Kumar (2011) e Ngai et al. (2011) referem estimativas de que a fraude nos cartões de crédito atinge um custo anual nos USA superior a US$ 400 bilhões e no Reino Unido gira em torno de 1,6 bilhão de libras. Métodos tradicionais que envolvem a detecção manual de fraudes não são apenas demorados, caros e imprecisos, em tempos de Big Data mostram que são ultrapassados. As instituições financeiras voltaram-se para processos automatizados, como relatam Sanchez et al. (2009) usando recursos estatísticos e computacionais por métodos de mineração de dados, com um foco particular em técnicas de inteligência computacional - Computational Intelligence (CI). Uma investigação mais detalhada sobre as diferenças nos tipos de fraude é defendida por West & Bhattacharya (2016) para aprimoramento dos métodos de detecção inteligente.

Alisson (2015) refere dados da pesquisa realizada em 2015 pela Serasa Experian mostrando que a cada 15,4 segundos é registrada uma tentativa de fraude por identidade onde dados pessoais são usados para fazer negócios pela internet sob falsidade ideológica ou obter crédito com a intenção de não honrar o pagamento. Johnson & Weggenmann (2013) realizaram um estudo nos relatórios financeiros dos cinquenta estados dos USA. Por força legal, as demonstrações financeiras de fundos governamentais americanos utilizam o regime de competência modificado da contabilidade e devem ser auditados por auditores independentes conforme os critérios do Conselho Governamental de Contabilidade - Governmental Accounting Standards Board, GASB (2016). As auditorias garantem a confiabilidade necessária para outros governos, órgãos legislativos, agências federais, agências de classificação de risco, os meios de comunicação e a sociedade americana. O estudo objetivou verificar se as contas estão em conformidade com a Lei de Benford e não apresentam indícios de fraude. Essas contas são as mais importantes referências da saúde financeira dos estados e oferecem amplo espectro de informações.

Durtschi, Hillison & Pacini (2004) afirmam que a aplicação da Lei de Benford é mais eficaz em grandes conjuntos de dados transacionais que representam mais de uma distribuição e segundo Hill (1995), com média maior que a mediana e a assimetria positiva, evitando assim os erros tipo I, falsos positivos e tipo II, falsos negativos. Apesar desta restrição, o estudo de Johnson & Weggenmann (2013) atestou que a Lei de Benford é eficaz para detectar desvios em pequenos conjuntos de dados como os obtidos no estudo, desde que acompanhados de testes de aderência adequados como o teste χ2 e o teste Z, evitando erros e perdas na investigação em dados não representativos, além disso o estudo apresenta o modelo de desvio médio absoluto refinado, o qual Johnson & Weggenmann (2013) creem ser o mais adequado e eficaz para estudo de pequenos conjuntos de dados.

Santos, Diniz & Corrar (2005) desenvolveram um estudo de caso em vinte municípios do Estado da Paraíba para verificar a eficácia da Lei de Benford na identificação de fraudes. Foi utilizada uma amostra de aproximadamente 104 mil notas de empenho. O estudo foi realizado pelo método dedutivo de aplicação prática da Lei de Benford, abstraindo o primeiro dígito e medindo o nível de significância por meio de testes de aderência Z e χ2 introduzidos por Nigrini (2000) para determinar a concordância com valores esperados, constatando que os testes adotados foram capazes de demonstrar a aderência dos dados à Lei de Benford. Santos, Diniz & Corrar (2005) definem a Lei de Benford como robusta para auxiliar os Auditores a detectar simples erros de digitação e fraudes contábeis no contexto de uma auditoria contábil tradicional ou de uma auditoria digital. É relevante a menção de que a distribuição de Benford é capaz de determinar o comportamento padrão das despesas praticadas pelos gestores públicos, traçando o perfil no qual a composição do primeiro dígito deve se comportar. Outra importante constatação de Santos, Diniz & Corrar (2005), destaca que a análise feita pela Lei de Benford foi capaz de explicar fatos que derivam de uma análise qualitativa, os dados que apresentaram problemas de aderência à Lei de Benford foram de municípios que realmente apresentaram problemas de gestão com relação à conformidade com os dados do Tribunal de Contas do Estado. As conclusões finais permitiram identificar que a Lei de Benford é eficaz e precisa, Santos, Diniz & Corrar (2005) evidenciaram nas análises, o indício de fraude por superfaturamento e fracionamento de despesas para burlar o limite estabelecido pela Lei Federal no 8.666/1993, que disciplina regras de aquisições mediante licitações.

As auditorias em obras públicas têm gerado oportunidades de aprofundamento na verificação da aplicação das verbas públicas por parte do governo brasileiro. Cunha & Bugarin (2014) trazem dentre as mais discutidas, as obras realizadas nos estádios para a Copa do Mundo de 2014. A exemplo de Nigrini (2011, 2012), autor que introduziu a aplicação da Lei de Benford na prática da contabilidade forense nos Estados Unidos, Cunha & Bugarin (2014) realizaram um estudo nos dados da auditoria realizada em 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre os recursos aplicados na reforma do Estádio do Maracanã para identificação de suspeitas de fraude financeira. Os autores utilizaram a Lei de Benford associada a curva ABC aplicada na auditoria do TCU para a análise do sobre preço nos valores dispendidos na obra. Além da análise dos primeiros dígitos significativos de Benford, foi aplicada a análise dos dois primeiros dígitos significativos e o teste da soma desenvolvido por Nigrini (2011, 2012) capaz de confrontar os resultados apurados, aumentando a capacidade de verificação da conformidade dos dados. O Teste da Soma por sua vez, é um teste avançado onde, ao simular uma distribuição de Benford verifica-se que as somas dos números de cada grupo dos dois primeiros dígitos 10, 11, . . . , 99, resultam valores aproximadamente iguais, ou seja, 1/90.

Todavia, Nigrini (2011, 2012) constatou que dados reais raramente se conformam a esse padrão, isto porque apresentam valores muito altos e muitas repetições de números de valor médio. Quando o teste da soma é confrontado com o teste dos dois primeiros dígitos também se confronta o volume de dados contidos em cada grupo com a soma de seus valores. No caso de orçamento de obras públicas, identifica-se a materialidade e a relevância de cada grupo de dados, permitindo selecionar os dígitos que merecem uma análise mais crítica por parte do auditor. Cunha & Bugarin (2014) recomendam a aplicabilidade da Lei de Benford em auditorias públicas e identificaram valores com frequências excessivas pela análise dos dois primeiros dígitos de Nigrini (2011, 2012) indicando fraude financeira.

O quadro 1 apresenta um resumo com as principais contribuições dos autores, bem a sua relação com os procedimentos adotados neste trabalho.

Quadro 1: Autores, contribuições e procedimentos

Autores

Contribuição

Procedimentos

West J. & Bhattacharya, M. (2016)

Revisão da literatura sobre detecção de fraude financeira no período de 2004 a 2014

Mineração de dados e Inteligência computacional (IC)

Yeh, I.C & Lien, C. (2009)

Comparação preditiva da acurácia na determinação da probabilidade de inadimplência em padrões de pagamento com cartões de crédito

Método de Classificação por Suavização em Mineração de dados

Bhattacharya, Xu & Kumar (2011)

Aplicação da lei de Benford como ferramenta de apoio em auditorias na detecção de fraudes financeiras

Estudo numérico por rede neural artificial geneticamente otimizada

Ngai et al. (2011)

Revisão da literatura e criação de um quadro para a classificação de fraude financeira

Mineração de dados, modelos logísticos, redes neurais, sistema bayesiano e árvores de decisão

Sanchez, D., Vila, M., Cerda, L. & Serrano, J.M. (2009)

Identificar padrões normais de transações ilegais em dados transacionais de cartões de crédito

Regras de associação por lógica Fuzzy em Mineração de dados

Alisson, E. (2015)

Cálculo da probabilidade de fraude em transações com cartão de crédito

Métodos estatísticos preditivos para cálculo de probabilidades

Johnson, G.G. & Weggenmann, J. (2013)

Aplicação da Lei de Benford em relatórios financeiros de auditorias estaduais anuais nos Estados Unidos

Localização do primeiro dígito usando a programação da Lei de Benford da Audit Comand Language (ACL) para identificar dados tendenciosos

Durtschi, C., Hillison, W. & Pacini, C. (2004)

Efetividade da lei de Benford na detecção de fraudes em auditorias financeiras

Análise digital de dados baseada na lei de Benford

Hill, T.P. (1995)

Predição da ocorrência dos dígitos significativos de Benford em diferentes contextos empíricos

Modelagem matemática computacional para identificar fraude financeira

Santos, J.,Diniz, J.A. & Corrar, L.J. (2005)

Identificação de suspeita de fraude por fracionamento e superfaturamento de despesas públicas em auditoria digital

Modelo de contabilometria aplicando a Lei de Benford e testes de hipóteses para medição do nível de significância

Nigrini, M.J. (2000)

Abordagem por auditoria contínua, ênfase em procedimentos analíticos e diagnósticos orientados para a tecnologia

Proporção dos dois primeiros dígitos com base na Lei de Benford, testes de aderência para confirmar dados de auditorias passadas

Cunha, F.C.R & Bugarin, M.S. (2014)

Aplicação da Lei de Benford em dados de auditoria do TCU para a análise do sobre preço em obras públicas

Mineração de dados, teste dos dois primeiros dígitos significativos, soma dos primeiros dígitos de Benford, testes de aderência da Média dos Desvios Absolutos e Qui-Quadrado

Nigrini (2011, 2012)

Introdução da Lei de Benford na contabilidade e auditoria forense dos USA para identificar fraude financeira

Teste da soma dos dois primeiros dígitos significativos de Benford

Fonte: Publicações pesquisadas

3. CARTA DE CONTROLE MULTIVARIADA DE BENFORD

Processos de qualquer natureza apresentam variações. A padronização torna mais simples a análise estatística de qualquer conjunto de dados e isso inclui as movimentações financeiras. Shewhart (1931) e Montgomery (2016) definem as variações como comuns ou aleatórias e variações atribuíveis ou especiais. As variações comuns são o efeito cumulativo de muitas causas pequenas, essencialmente inevitáveis (naturais). Um processo que opera apenas com as causas comuns de variação está sob controle estatístico, portanto, as causas aleatórias são integrantes naturais dos processos. As variações especiais são oriundas de interferências que ocorrem de forma excepcional no processo. Tal variabilidade é muito grande quando comparada às naturais. Estas fontes de variabilidade têm sua origem por interferência externa aos processos, em geral, máquinas ajustadas inadequadamente, erros de operação, matéria prima defeituosa, excessiva interferência no processo e/ou dados manipulados. De acordo com Shewhart (1931) e Montgomery (2016), um processo que opera com presença de causas especiais está fora de controle estatístico.

A aplicação das Cartas de Controle de Processos, sejam univariados ou multivariados seguem critérios para assegurar a sua adequada implementação. Montgomery (2016) orienta para a correta implementação de Cartas de Controle. Deve-se seguir os passos que envolvem o que se chama de Fase I e de Fase II, com dois objetivos distintos e complementares. Na fase I, um conjunto de dados coletado do processo é analisado de uma só vez, em uma análise chamada de retrospectiva. Com base nessa análise, determina-se os limites de controle de teste para avaliar se o processo estava sob controle estatístico durante o período em que os dados foram coletados e, para verificar se limites de controle confiáveis podem ser estabelecidos para o monitoramento futuro. A fase II se inicia após a obtenção de um conjunto de dados onde somente causas aleatórias agem sob o mesmo. Os dados são coletados sob condições estáveis e representativas do desempenho de um processo sob controle estatístico. Portanto, na fase II a Carta de Controle é usada para monitorar o processo. Compara-se a estatística amostral para cada amostra sucessiva a medida que ela é extraída do processo com os seus limites de controle. A forma de medir a performance das Cartas de Controle é dada pelo Número Médio de Amostras Coletadas até a detecção de sinais fora de controle (Average Range Length - ARL). Geralmente, a detecção de sinais é realizada por simulação, avaliando a capacidade da Carta de Controle.

O monitoramento de suspeitas de indicativo de fraude por lavagem de dinheiro baseado em Cartas de Controle multivariadas foi definido inicialmente em um modelo conceitual por simulação, que consiste no tipo de distribuição de probabilidades que representam os dados oriundos de lançamentos financeiros. Para o estabelecimento da Fase II considerou-se que lançamentos financeiros aderem a distribuição dos primeiros dígitos de Benford.

O método de monitoramento escolhido foi a Carta χ2, quando se assumiu como verdadeira a distribuição de Benford em lançamentos financeiros (parâmetros conhecidos). Quando se optou pela avaliação de dados anteriores (históricos) com parâmetros estimados na Fase I, utilizou-se a carta T2 de Hotelling (parâmetros desconhecidos). Cabendo mencionar que a aplicação em dados históricos ocorreu pelo Gráfico de Função de Distribuição Acumulada Empírica onde a distribuição dos dados é estimada pelos próprios dados.

A carta χ2 apresenta estatística de monitoramento e limites de controle determinados pelas Equações (1) e (2). (Umit e Cigdem,2001).

(1) χ2i=n(xj-μj) ∑-1 (xj-μj ); i=1,…,t;j=1,…,n

(2) LSC= χ2α,2g.l.,

Onde em χ2i, n é o tamanho da amostra ou do subgrupo, xj é o valor da observação da variável j coletada, μj é a média da população para a variável j, ∑ é a matriz de covariâncias e i indica a amostra ou subgrupo coletado no tempo t. Em LSC, 2g.l. é dois graus de liberdade.

Já a Carta T2 de Hotelling apresenta estatística de monitoramento e limites de controle determinados pelas Equações (3) e (4). (Mason et. al., 1997).

. .. . ..

(3) Τ2=n(X-X) S-1 (X-X),

(4) LSC= χ2α,p,

..

Onde em Τ2, X e S-1 são os estimadores comuns do vetor médio e da matriz de covariância obtida de uma série histórica de dados e n é o tamanho da amostra ou subgrupos. Em LSC, as proporções p de χ2α definem o limite de controle.

Um alarme será sinalizado pela carta sempre que uma estatística calculada pelas equações (1) e (3) for superior aos Limites de controle estabelecidos pelas Equações (2) e (4), respectivamente. Os resultados de ARL foram obtidos pela geração de um conjunto de dados histórico simulados de uma matriz de dados com m=500 linhas (amostras) e p=9 colunas, que representam os primeiros dígitos significativos de Benford. Com origem nesta matriz obteve-se estimativas de média X e de variabilidade, desvio-padrão I e a variância s2 para a proporção de cada dígito significativo. Ao final, este vetor de proporções médias foi normalizado para atender a restrição de que a soma das proporções pj de cada dígito (ie{1,2,3,…,9}) é igual a um.

As estimativas de variâncias e covariâncias produziram matrizes que não são inversíveis. Foram testados procedimentos de inversão generalizada para a matriz de covariâncias, mas os resultados não foram satisfatórios devido a problemas de convergência. Com isso, definiu-se a matriz ∑ como uma matriz diagonal, sendo a diagonal composta pelas variâncias estimadas das proporções de cada dígito. Esta é uma suposição forte, pois assume a independência entre as proporções individuais do valor de cada primeiro dígito, o que de fato não é observado, devido à restrição imposta, onde a soma das proporções dos valores de todos primeiros dígitos é igual a um.

Para a confirmação da aderência dos dados simulados à distribuição, foram gerados lançamentos para obtenção de primeiros dígitos significativos. Ao número de lançamentos foi atribuído um comportamento normalmente distribuído com média 200 e desvio-padrão igual a 15. Posteriormente foram obtidos os primeiros dígitos significativos. A proporção de cada dígito significativo foi então obtida e utilizada para o cálculo da estatística de monitoramento. Após, esta estatística de monitoramento foi confrontada com o limite de controle definido para a identificação do status de controle estatístico do processo. Este procedimento repetiu-se até que fosse obtido um alarme e registrado o número de observações até a ocorrência deste alarme. O processo repetiu-se até que fossem observados 50.000 alarmes.

Os desvios d correspondem as proporções de 0,0; 0,5; 1,0; 1,5; 2,0; 3,0 e 5,0 desvios-padrão σ, adicionados à média em cada série de 50.000 alarmes gerados para avaliar a concordância entre os dois métodos na geração dos ARLs. No caso específico do presente trabalho, tanto devido a magnitude dos valores observados - referentes aos primeiros dígitos significativos (ie {1,2,3,…,9}), com a restrição de que a soma das proporções dos primeiros dígitos é igual a um.

Comparando-se os dados gerados para as duas Cartas de Controle nas Tabelas 1 e 2, verifica-se que os valores de ARL encontrados para cada desvio d adicionado a média das séries, bem como os desvios padrão σ do RL resultaram em valores muito próximos. Isso determina que as duas estatísticas concordam entre si confirmando a aplicabilidade do método desenvolvido na simulação. (Souza, 2017).

Após a análise da simulação, percebeu-se que os valores de ARL, como demonstrados nas Tabelas 1 e 2, não atendiam aos valores esperados de acordo com os limites teóricos (a = 0,27%: ARL0=370). As tabelas 1 e 2 ainda informam o número de dados gerados (k) para a obtenção de 50.000 alarmes, além do tempo em segundos gastos na simulação de cada cenário. Nesta simulação foram ainda incluídos desvios d a fim de identificar o número de observações necessárias para identificar que o processo saiu fora de controle (ARL1).

Tabela 1: Avaliação da aplicação da Carta de Controle χ2 - Distribuição dos primeiros dígitos (dBenford)

d

ARL

s RL

k

Alarmes

Tempo (s)

0,0

141,00

140,2

7.049.946

50000

309.370,8

0,5

76,44

76,3

3.821.896

50000

99.975,6

1,0

33,64

33,2

1.681.955

50000

22.512,5

1,5

14,91

14,3

745.676

50000

4.336,0

2,0

7,21

6,7

360.263

50000

981,7

3,0

2,41

1,8

120.444

50000

172,4

5,0

1,06

0,2

52.893

50000

61,1

Fonte: Dados da simulação

Tabela 2: Avaliação da aplicação da Carta de Controle T2 - Distribuição das médias da estatística (eBenford)

d

ARL

s RL

k

Alarmes

Tempo (s)

0,0

141,13

140,4

7.056.499

50.000

164.458,3

0,5

77,59

77,4

3.879.606

50.000

53.757,0

1,0

34,32

33,9

1.715.858

50.000

13.262,3

1,5

15,34

14,8

767.134

50.000

2.797,7

2,0

7,32

6,7

366.140

50.000

580,3

3,0

2,43

1,9

121.457

50.000

91,3

5,0

1,06

0,3

53.128

50.000

32,4

Fonte: Dados da simulação

Um procedimento comum no controle multivariado para contornar esta situação é a obtenção dos limites de controle por simulação. (Korzenowski, A. L., & Simões, W. L., 2018). Os ARL0 e os LSC padrão servem para utilização no processamento de dados reais. O período de expectativa de um alarme falso dado pelo valor do ARL0 é correspondente ao número de estatísticas em média, necessárias para a ocorrência de um alarme falso. Limites foram simulados e os resultados são apresentados na Tabela 3. Note que, o limite de controle é estabelecido para um dado ARL0 desejado. No caso de estudo, por exemplo, foi utilizado como limite de controle 17,07, uma vez que o montante de observações era pequeno e alarmes falsos com menores frequências não impactariam nas análises.

Tabela 3: ARLs e LSCs estimados

ARL0

LSC

141

23,57

100

22,45

75

21,51

50

20,17

40

19,43

30

18,48

20

17,07

10

14,62

Fonte: Dados da simulação

A implantação do modelo em software consistiu em duas etapas: a primeira com a geração de dados aleatórios de acordo com as características identificadas na definição do modelo conceitual, e a segunda, a implantação da formulação de monitoramento baseada nas Cartas de Controle definidas.

Na fase de simulação foram geradas perturbações adicionais a fim de caracterizar alterações na distribuição dos dígitos significativos. Isso foi necessário para avaliar a capacidade de detecção das ferramentas de monitoramento adaptadas para este estudo. Os ruídos foram inseridos com base em uma distribuição Normal multivariada, com vetor de médias zero e matriz de covariâncias similar a observada, conforme apurado nas distribuições de frequências realizadas na análise inicial. Estas simulações foram utilizadas para a avaliação de aplicação dos métodos permitindo análise dos resultados e o procedimento de inserção de ruídos para avaliação da performance das ferramentas de controle foi incorporado ao algoritmo de simulação.

Foram desenvolvidas funções para a distribuição de Benford no software R e o código destas funções foi utilizado para a geração de dados aleatórios com o comportamento da distribuição. O algoritmo representa a implementação na Linguagem R-Project utilizada na geração e análise de dados em estudo neste artigo. Uma vez gerados os dados de controle, dados perturbados e as técnicas estatísticas de monitoramento terem sido implementadas, seus resultados puderam ser avaliados. Foi utilizado o teste χ2 para a verificação de aderência dos dados à distribuição de Benford. (Silva et. al., 2014).

4. RESULTADOS DA APLICAÇÃO DA CARTA DE CONTROLE MULTIVARIADA DE BENFORD NAS CONTAS DAS ELEIÇÕES 2016

A literatura sugere a necessidade de um recurso de vigilância estatística a ser aplicada na análise financeira. Divergências em relação à Lei de Benford são indicativos de suspeita de dados fraudulentos. Para unir estas duas condições, pode-se utilizar uma Carta de Controle Multivariada de Benford como recurso de suporte a auditoria de sistemas de informação para o monitoramento de lançamentos financeiros.

O método desenvolvido foi aplicado em dados da prestação de contas do pleito municipal de 2016, coletados junto aos Tribunais Regionais Eleitorais por intermédio dos dados do Tribunal Superior Eleitoral do Brasil (TSE, 2016b). Os dados selecionados referem-se à divulgação da prestação de contas dos candidatos a prefeito das capitais dos estados que representam os cinco maiores colégios eleitorais do país. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral TSE (2016a), a relação do primeiro ao quinto lugar são os estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul, suas capitais em mesma sequência são São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre.

Optou-se por analisar as contas dos candidatos que ficaram em primeiro e em segundo lugar, independentemente da ocorrência de candidato vencedor no primeiro ou no segundo turno e os dados analisados constam do agrupamento de receitas e despesas de cada candidato em uma única planilha em Excel.

Na sequência, são destacadas as prestações de contas dos candidatos das cinco capitais analisadas. Em cada figura aparecem as Cartas de Controle dos dois candidatos - Figuras 1 a 5. A figura da esquerda (a) refere-se ao candidato que ficou em segundo lugar e a figura da direita (b) refere-se ao candidato que ficou em primeiro lugar no pleito. Para efeito de análise da aderência dos dados, o período é representado em semanas de acordo com o monitoramento da campanha. Tomou-se o limite de controle padronizado LSC = 17,07 referente ao ARL0 = 20 períodos, calculado por simulação conforme a Tabela 3, uma vez que o maior número de semanas é 18 referente a Capital C que não atinge a 20, portanto, não há expectativa da ocorrência de um alarme falso em número menor que 20 estatísticas plotadas na Carta de Controle.

Figura 1: Cartas de Controle multivariadas de Benford para avaliação de suspeitas de fraude - Prefeitura da Capital A - Brasil - Eleições 2016

Fonte: dados da pesquisa.

Observa-se que o candidato A1, em segundo lugar, apresentou em sua prestação de contas 3.735 linhas de movimentações financeiras em 13 semanas de lançamentos. O candidato A2, em primeiro lugar, apresentou em sua prestação de contas 899 linhas de movimentações financeiras em 12 semanas de lançamentos. Verifica-se que, apesar das estatísticas do candidato A2 apresentarem tendência positiva nas últimas três semanas, não há efeito inconclusivo em razão do término do período de análise.

Considerando a Figura 2, o candidato B1, em segundo lugar, apresentou em sua prestação de contas 1.476 linhas de movimentações financeiras em 16 semanas de lançamentos. O candidato B2, em primeiro lugar, apresentou em sua prestação de contas 1.756 linhas de movimentações financeiras em 13 semanas de lançamentos. Verifica-se que as estatísticas do candidato B1 apresentam picos nas semanas 5, 13 e 14, demonstrando alguma instabilidade, porém não significativa.

Figura 2: Cartas de Controle multivariadas de Benford para avaliação de suspeitas de fraude - Prefeitura da Capital B - Brasil - Eleições 2016

Fonte: dados da pesquisa.

Na semana 16 o pico é devido a atribuição de valor igual a 0 (zero) na semana 15, que não apresentou movimentações. O candidato B2 mostra um pico na estatística da semana 9 e tendência positiva nas últimas duas semanas, sem efeito conclusivo em razão do término do período de análise.

Considerando a Figura 3, temos as Cartas de Controle da análise dos dados referentes ao pleito na Capital C. O candidato C1, em segundo lugar, apresentou em sua prestação de contas 18.344 linhas de movimentações financeiras em 18 semanas de lançamentos. O candidato C2, em primeiro lugar, apresentou em sua prestação de contas 2.000 linhas de movimentações financeiras em 14 semanas de lançamentos. Verifica-se que as estatísticas do candidato C1 apresentam estabilidade até a semana 16, na semana 17 foi atribuído valor 0 (zero) em razão de não haver lançamentos e um pico na semana 18 que demonstra uma tendência positiva sem confirmação em razão do término do período de análise.

Figura 3: Cartas de Controle multivariadas de Benford para avaliação de suspeitas de fraude - Prefeitura da Capital C - Brasil - Eleições 2016

Fonte: dados da pesquisa.

As estatísticas do candidato C2 mostram estabilidade até a semana 10 e tendência positiva da semana 11 a 13 e tendência negativa na última semana, apontando instabilidade inconclusiva em razão do término do período de análise.

Considerando os lançamentos de movimentação financeira da campanha municipal da Capital D das Eleições 2016, a Figura 4 mostra os resultados encontrados.

Figura 4: Cartas de Controle multivariadas de Benford para avaliação de suspeitas de fraude - Prefeitura da Capital D - Brasil - Eleições 2016

Fonte: dados da pesquisa.

O candidato D1, em segundo lugar, apresentou em sua prestação de contas 503 linhas de movimentações financeiras em 14 semanas de lançamentos. O candidato D2 em primeiro lugar, apresentou em sua prestação de contas 1.992 linhas de movimentações financeiras em 12 semanas de lançamentos. Verifica-se que as estatísticas referentes ao candidato D1 apresentam relativa estabilidade em todo período, já o candidato D2 mostra estabilidade nas estatísticas até a semana 10 e tendência positiva da semana 11 até a 12, apontando tendência inconclusiva em razão do término do período de análise.

Por fim, as Cartas de Controle da análise dos dados referentes ao pleito na Capital E são apresentadas na Figura 5.

Figura 5: Cartas de Controle multivariadas de Benford para avaliação de suspeitas de fraude - Prefeitura da Capital E - Brasil - Eleições 2016

Fonte: dados da pesquisa.

O candidato E1, em segundo lugar, apresentou em sua prestação de contas 1.082 linhas de movimentações financeiras. O candidato E2, em primeiro lugar, apresentou em sua prestação de contas 653 linhas de movimentações financeiras e ambos candidatos apresentaram 14 semanas de lançamentos. Verifica-se um ponto fora de controle nas estatísticas do candidato E1 na semana 1, esse ponto ao ser analisado mostrou ser fruto de apenas uma movimentação financeira nesta semana, que, portanto, provoca um viés na análise e deve ser desconsiderado. As estatísticas do candidato E2 mostram estabilidade em todo período analisado.

De modo geral, os candidatos apresentam todas estatísticas dentro do limite de controle, ou seja, mostram estatísticas que aderem a frequência dos primeiros dígitos e não sinalizam suspeição sobre os dados das movimentações financeiras no período analisado.

No recurso proposto nesta pesquisa, o operador avalia a frequência das movimentações financeiras do cliente para identificar o padrão de suas movimentações. A partir de então, o operador implementa o recurso de acordo com a frequência esperada dessas movimentações. Um estudo das movimentações financeiras de uma empresa de grande porte, em função do volume de lançamentos financeiros, muito provavelmente deverá ser monitorado de forma distinta aos lançamentos financeiros de uma pessoa física. Isto porque a estimativa de parâmetros necessita de um certo volume de dados.

Os limites de controle devem ser adequados à velocidade de detecção desejada e à taxa de alarmes falsos decorrentes da velocidade de detecção implementada. Por exemplo, um ARL0 = 20 prevê a ocorrência de um alarme falso em uma frequência esperada de 20 eventos que podem ser semanais, mensais, anuais ou em períodos definidos pelo operador em relação a frequência das movimentações financeiras a monitorar. Note que em relação a um período semanal, 20 semanas será o tempo decorrido entre eventos onde é esperado um alarme falso, ou seja, espera-se que transcorram 5 meses até um provável sinal falso. Os períodos serão escolhidos pelo operador, em princípio, conforme o padrão das movimentações financeiras e de acordo com o que o ARL0 determina, pela intenção de investigação de um alarme falso em maior ou menor período de tempo, ou então, regulado pela disponibilidade do operador em investigar um sinal de suspeita nas movimentações financeiras.

A adoção deste tipo de método auxilia na avaliação de potenciais fraudes, uma vez que estuda o comportamento dos dados frente a um modelo estabelecido, facilitando a identificação de pontos onde as equipes de auditoria podem atuar. Esta sinalização ocorre com mínimo custo computacional, minimizando o esforço de auditoria na análise de toda a estrutura de dados, permitindo o foco nos conjuntos onde efetivamente há suspeita de lançamentos fraudulentos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As entidades financeiras têm a responsabilidade de implementar ações de controle com a finalidade de proteger os investidores, assegurar a precisão, confiabilidade e ética no cumprimento de regras de governança corporativa por meio das estratégias dos negócios em conformidade com a legislação, bem como as entidades da administração pública devem respostas a sociedade em atendimento aos princípios da administração pública em todas esferas do Estado Brasileiro. O caput do artigo no 37 da Constituição Federal de 1988 preconiza a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência no que concerne a aplicação dos recursos do erário público, gestão dos bens, serviços e a adequada transparência em suas ações.

A forma mais prática de cumprir os regulamentos anti-lavagem de dinheiro é identificando as transações comerciais e financeiras normais dos clientes (atores da sociedade) para que as atividades incomuns ou suspeitas sejam reconhecidas. Assim, este estudo deu-se por modelagem e simulação, uso de técnicas matemáticas e de tecnologia para a solução do modelo matemático. A exemplo do controle estatístico de processos no meio industrial, foi aplicado um procedimento que consiste na implantação de uma Carta de Controle multivariada para o monitoramento de movimentações financeiras. A implementação do modelo em software ocorreu em duas etapas: na primeira, a geração de dados aleatórios, na segunda, a implantação da formulação de monitoramento baseada nas Cartas de Controle definidas. Para validação do procedimento de monitoramento adotou-se duas estratégias de análise. A primeira considerou a distribuição dos primeiros dígitos da movimentação financeira como sendo equivalente a distribuição de Benford. A estatística do teste é computada comparando o vetor de primeiros dígitos observados com o valor de referência dado pela distribuição de Benford, configurando um ambiente de monitoramento com parâmetros conhecidos caracterizado pela Carta de Controle χ2. A segunda pela geração de um conjunto de dados históricos, simulação de uma matriz de dados que representam os primeiros dígitos significativos. Este ambiente de monitoramento com parâmetros desconhecidos e estimados a partir de um conjunto de dados histórico caracterizado pela carta T2 de Hotelling. De posse das sequências de dados simulados avaliou-se a qualidade destas informações e verificou-se a aderência à Lei de Benford, validando desta forma o modelo de geração dos dados.

Conclui-se acerca dos dados analisados, que os candidatos A1, A2, B1, B2, C1, C2, D1, D2, E1 e E2 apresentaram todas estatísticas dentro do limite de controle, ou seja, atestando um processo sob controle estatístico onde as estatísticas geradas aderem a frequência dos primeiros dígitos, não sinalizando suspeição sobre os dados das movimentações financeiras.

Desta forma, a pesquisa justificou-se por aplicar recursos tecnológicos de hardware e de software baseados na Lei de Benford. Como referenciado, a Lei de Benford é de fácil processamento de grande massa de dados com carga computacional pouco onerosa. Os recursos de análise digitais apresentaram-se confiáveis, precisos e estão incorporados em softwares populares. Para tanto, foi desenvolvido um método que consiste na implementação de uma Carta de Controle multivariada para o monitoramento de movimentações financeiras. O método de monitoramento aplicado foi o da Carta de Controle χ2, uma vez que foi admitida a aderência dos dados à Lei de Benford, ou seja, parâmetros conhecidos.

A performance dos procedimentos propostos para o monitoramento ficou evidenciada nas estratégias utilizadas nas simulações realizadas e no exemplo prático aplicados em dados de prestação de contas de candidatos a prefeito no Brasil nos cinco maiores colégios eleitorais do país.

A contribuição acadêmica identifica-se pelo desenvolvimento de um modelo de aplicação da Carta de Controle multivariada de Benford com uma abordagem do controle estatístico de processos como suporte a auditoria e/ou monitoramento de movimentações financeiras, utilizando recurso computacional acessível, de fácil processamento, confiável e preciso que permite aprimoramento por novas abordagens. Como contribuição à sociedade, se dá pela oportunidade de aplicação do modelo nos dados de organizações civis e estatais, divulgados nos canais de informação, de modo a proporcionar acesso a análise e a constatação da idoneidade no uso de recursos monetários e prevenir fraudes. Para novas abordagens de pesquisa sugere-se efetuar o aprofundamento da análise individual e conjunta do primeiro e segundo dígitos significativos, bem como estratégias não paramétricas e de auto-inicialização.

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Como referenciar

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1 davenilciol@edu.unisinos.br Universidade do Vale do Rio dos Sinos - https://orcid.org/0000-0003-0797-5081

2 akorzenowski@unisinos.br Universidade do Vale do Rio dos Sinos - https://orcid.org/0000-0002-7640-2845

3 hein@furb.br Universidade Regional de Blumenau - https://orcid.org/0000-0002-8350-9480

4 akroenke@furb.br Universidade Regional de Blumenau - https://orcid.org/0000-0001-6625-3017

DOI: http://dx.doi.org/10.14392/asaa.2019120202

Artigo submetido em: 22/05/2018. Revisões requeridas em: 01/04/2019. Aceito em: 21/08/2019.